Maurinho acabava de completar 20
anos. Há 5 anos, veio do interior para a capital, Belo Horizonte. Conseguiu um
emprego no Banco da Lavoura de Minas Gerais e já começava a ganhar um
dinheirinho. O ano era 1958, e o Brasil acabara de conquistar o primeiro título
mundial de futebol na Suécia. As coisas pareciam tranquilas, mas Maurinho
começou a emagrecer sem uma causa aparente. Arranjou uma tosse chata, que já
durava 2 meses, além de uma febre que vinha com mais frequência a noite. Os amigos passaram a notar, mas Maurinho
desconversava. Certa feita, em uma manhã mais fria de inverno, tossiu tanto que
escarrou sangue. Tinha alguma coisa de errado. Resolveu procurar um médico.
Após um exame clínico criterioso, avaliação do escarro e uma abreugrafia,
o diagnóstico: tuberculose. Maurinho ficou sem chão. Tuberculose era certeza de
morte. Mandou uma carta para os seus pais no interior e comunicou sua
internação em um sanatório para tratamento.
Naquela época, tuberculose não
possuía tratamento medicamentoso efetivo. A mortalidade era altíssima. O
diagnóstico de tuberculose era catastrófico. Belo Horizonte era um dos
principais pólos de tratamento, devido ao clima. Maurinho deu muita sorte. Como
trabalhava no Banco da Lavoura, tinha acesso ao tratamento de ponta através do
IAPB (Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários) e foi internado no
Sanatório Minas Gerais, atual Hospital Alberto Cavalcanti.
Chegou ao sanatório cabisbaixo,
triste, mas confiante. As chances eram mínimas, mas existiam. Ele ficou
encantado com a estrutura do sanatório. Quartos muito bem arejados, limpos e
bem cuidados. Refeições de primeira linha. No café da manhã, por exemplo,
escolhia-se o suco natural da sua preferência. As quartas e sábados, ocorriam
sessões de cinema. O local era maravilhoso, cercado de árvores e muito ar puro,
vitais para o tratamento conhecido na época. Jogos de sinuca, dama, xadrez e
baralho eram constantes. O sanatório era um hotel de luxo para os segurados do
IAPB.
Na primeira semana, logo no início do
seu tratamento, Maurinho conheceu Cristóvão, trinta e poucos anos, e já
internado há dois anos sem conseguir se curar. Cristóvão, porém, não parecia
doente. Tornaram-se grandes amigos. Após duas semanas, Maurinho descobriu o
segredo do amigo. Mensalmente, os médicos solicitavam o escarro dos
pacientes para avaliar uma possível cura. A pesquisa do BAAR (Bacilo
Álcool Ácido Resistente), identifica a micobactéria causadora
da tuberculose. Os pacientes com escarro negativo eram considerados aptos
a deixar o sanatório. Cristóvão era um contrabandista de escarro positivo.
Abordava os pacientes recém chegados e negociava a coleta de escarro dos
mesmos. Utilizava os escarros positivos nos seus exames mensais e vendia para
aqueles que, assim como ele, não queriam sair do sanatório. Afinal de contas,
perder aquela mordomia era inadmissível para vários pacientes internados.
Em troca do escarro, Cristóvão
arranjava desde dinheiro até umas moças para os colegas que
disponibilizavam o material. O esquema era forte. Maurinho ficou com medo de
ser pego e não se envolveu no contrabando de escarro. O tempo passava e
inúmeros colegas morriam. Hemoptises fulminantes eram as mais temidas pelos
internos. A cena se repetia quase semanalmente. Maurinho e Cristóvão
fortaleceram a amizade em meio ao drama do sanatório.
Após 9 meses, sentindo-se bem melhor, o exame de Maurinho veio
negativo. O repouso, o ar puro, a boa vida, a fé e a vontade de viver
conseguiram curar sua tuberculose. Ele estava livre. Dois anos mais tarde,
reencontrou Cristóvão no banco. O encontro foi marcante para os dois.
Combinaram de sair para tomar uma cerveja e colocar o papo em dia. Após umas
cachaças, Cristóvão contou para o amigo sobre o seu novo “empreendimento”,
dessa vez mais arriscado para ele, porém, com um retorno alto.
Naquela época, exame positivo para xistose era motivo de
dispensa do serviço, para tratamento, durante um mês. Quando descobriu que era
portador de xistose, apesar de não sentir absolutamente nada, Cristóvão começou
a faturar em cima da sua nova doença. Recebia o tratamento, mas não tomava os
remédios. Vendia suas fezes com a garantia do resultado positivo. Inúmeros
colegas compravam as fezes de Cristóvão para descansar do trabalho durante um
mês. Manteve seu negócio durante mais 6 anos sem ser descoberto. Quando
percebeu a barriga inchando muito, resolveu se tratar, fechando as portas do
seu empreendimento e encerrando sua carreira de contrabandista.
Hoje,
completo um ano de postagens no “Divagando em Saúde”. Confesso que é muito
difícil escrever semanalmente, mas é gratificante. Após mais de 24 mil
acessos, noto que esse “trabalho” vale a pena. Vou descansar durante duas
semanas e retorno em setembro com mais divagações…
eu como estive internado na sanatorio alberto cavalcan ti de 1961 a 1963, confirmo plenamente a narrativa referente a alimentação e as acomodações do sanatorio. coisa de primeiro mundo. A titulo de bate papo inmformo que aos domingos decia para o bairro padre eustaquio de manhã tomar cerveja e jogar sinuca , na volta na subida da rua para o sanatorio tinha um linda moreninha de seus 15 ou16 anos que ficava esperando eu passar para me ver, quando ela não estava ali, as colegas dela corriam a cha,ma-la para me ver.
ResponderExcluiresta postagem acima de 28/janeiro/2017 , corresponde a minha historia, sem mudar uma virgula ou ponto. realemnte fuiz feliz na minha estada no sanatorio
ResponderExcluir